O uso de dados em um campo em disputa : uma análise de enquadramento sobre a cobertura midiática das mortes violentas no Brasil (2000 a 2020)

Abstract

Este estudo busca investigar os enquadramentos adotados na cobertura midiática sobre mortes violentas no Brasil e compreender se e como os dados são mobilizados nesta cobertura. Empiricamente, analisamos a cobertura do jornal Folha de São Paulo entre os anos de 2000 e 2020, em uma leitura guiada a partir de master frames relevantes ao campo da segurança pública: a caracterização sobre os autores e as vítimas da violência letal, de um lado, e a caracterização sobre as causas e as medidas de enfrentamento dessa violência, de outro. Ao discutirmos o papel da informação na rede de políticas de segurança pública, abordamos novas formas de participação social neste campo, que se aproximam do modelo de associação oferecido pela literatura sobre think tanks. Analisamos as organizações da sociedade civil centradas na produção intensiva de conhecimento, que adotam estratégias de incidência política fundadas nos princípios de transparência e promoção do controle social de dados públicos, criam pontes de diálogo entre usuário e produtores de estatísticas criminais e disputam a agenda pública e midiática sobre os temas de segurança pública. Observamos que este novo tipo de participação social impacta a forma como a mídia se relaciona com o tema da violência e consolida, enfim, a tendência esboçada no início dos anos 80, de qualificação da cobertura midiática sobre segurança pública, que passa a ser abordada nas editorias nacionais, com foco nos textos de caráter analítico, em detrimento dos textos episódicos e com crescente uso de dados e estatísticas para subsidiar as análises. Em relação aos enquadramentos, observamos que as principais mudanças aconteceram nas formas de caracterização das vítimas e autores da violência, enquanto as leituras sobre as causas e as respostas ao fenômeno da violência foram menos afetadas pelas transformações do período analisado.