Educação contextualizada da escuta : uma etnografia da formação de psicólogos-psicoterapeutas a partir do Sankofa, grupo de estágio e serviço de psicoterapia para universitários negros

Abstract

Esta pesquisa teve como objetivo compreender a formação de psicólogos-psicoterapeutas para o atendimento de demandas raciais na clínica psicológica. A partir de uma etnografia posicionada junto ao Sankofa, um grupo de estágio e serviço de psicoterapia para universitários negros, em funcionamento numa universidade do centro-oeste brasileiro, conjugo teorias, documentos, observação participante, entrevistas e o diário de campo para caracterizar a história, funcionamento e as estratégias formativas do grupo. Com trabalho de campo entre abril e dezembro de 2023, discuto documentos que orientaram a formação institucional vivida pelas interlocutoras, como as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em psicologia (DCN), o Projeto Pedagógico do Curso (PPC), ementas e currículo, delineadas e aplicadas por um quadro docente composto por mais de 90% de pessoas brancas sem expertise nas relações étnico-raciais, o que esculpiu uma formação descontextualizada socioculturalmente, e, portanto, desracializada, em termos ontoepistêmicos e praxiológicos. Na observação participante das reuniões de supervisão, grupo de estudos e atividades do Sankofa, foram frequentes os obstáculos impostos pela Clínica-Escola para o seu pleno funcionamento, instituição na qual o grupo funcionava. Os obstáculos identificados se deram nos termos de vigilância, deslisura e arbitrariedades que culminaram no encerramento do grupo de estágio pela segunda vez em sua história, indicativo do racismo institucional. Fricções essas que sinalizaram sobre a intencionalidade da Instituição e das pessoas que a fazem, denotando suas concepções sobre Ciência, Saúde, Racismo, Cuidado e Ética. Ao mesmo tempo, na conjunção das entrevistas, foi possível caracterizar os itinerários formativos propostos pelo Sankofa para formar profissionais atentos à demanda racial em psicoterapia, através da paridade racial, do letramento racial e das supervisões, como um processo de educação da escuta respondente às demandas materiais e simbólicas da maioria da sociedade brasileira, consoante à ética profissional.