"Estamos no bote salva-vidas, mas não sabemos para onde estamos indo” : escuta política do trabalho em contextos de crise

Abstract

A organização do trabalho e seus modos de gestão afetam não apenas a saúde dos trabalhadores como também os vínculos estabelecidos entre eles. Diante de uma gestão gerencialista, modelo típico do capitalismo, os laços entre os trabalhadores dão lugar à competitividade e ao individualismo. Contudo, a precarização nas relações e nas condições de trabalho são fruto de uma precarização generalizada, que ocorre a nível mundial. A insegurança é uma das diversas consequências desses cenários de crise, manifestando-se em medo generalizado, emudecimento e solidão. Em nosso país, de forma particular, o concurso público é percebido por muitos brasileiros como uma alternativa frente os altos índices de desemprego e a instabilidade da iniciativa privada. Entretanto, atualmente o setor público também vivencia períodos de crise, com cortes de orçamento e uma consequente precarização das condições de trabalho. Tendo por referência esse contexto, esta dissertação visa investigar os impactos da organização do trabalho em trabalhadores de uma empresa pública. Por meio de uma pesquisa de natureza qualitativa, buscou-se proporcionar possibilidades de resgate da dignidade e de ação, apesar do contexto de “turbulência” instaurado na empresa. Foram realizadas dez sessões coletivas em clínica do trabalho com catorze trabalhadores pertencentes à Navegação Aérea. Considera-se que espaços coletivos de discussão viabilizam o reconhecimento dos afetos e a legitimação do sofrimento silenciado. Os dados foram analisados por meio da ACT (Análise Clínica do Trabalho). Os resultados apontam um cenário de instabilidade composto por perdas na remuneração, forte percepção de injustiça, sobrecarga e incertezas. As queixas evidenciam a crise em que se encontra o setor público e revelam a fragilidade da segurança e estabilidade fortemente associadas a esse setor.