Como os diários impressos podem continuar interessantes com a concorrência dos serviços em tempo real? As reformas de O Globo em 1995 e do Correio Braziliense em 2000 à procura da resposta

Abstract

Este trabalho se inscreve entre os da teoria de produção de notícia e realiza levantamento, exame e comparação dos casos concretos de reformas gráficas com pretensões editoriais (bem como das dificuldades para implantá-las) em dois dos principais jornais do país, líderes em suas regiões na época das mudanças estudadas, O Globo e o Correio Braziliense. Para enfrentar a nova concorrência de tecnologias jornalísticas em tempo real - como agências de notícias, sites na Internet e a televisão por assinatura 24 horas no ar - e tentar se atualizar frente a mudanças sociais, os dois jornais resolveram se modernizar para continuar atraentes aos leitores e crescer. Por meio do método etnográfico, comparamos as mudanças no dois jornais, pelos seus objetivos e pelas seguintes categorias, usuais em estudos de teoria de produção de notícias: critérios de noticiabilidade, narrativa (texto e projeto gráfico) e rotinas de produção (planejamento e agilidade, fontes e recursos humanos). Constatamos que os dois jornais apostaram em soluções diferentes uma em relação à outra, mas semelhantes no princípio de oferecer conteúdo diferenciado e de mais qualidade, como alternativa à velocidade de outros meios. Verificamos, pela comparação das duas reformas com textos sobre jornalismo dos anos 60 e 70, que esse mesmo tipo de proposta foi defendido naquela época como forma dos impressos enfrentarem a concorrência da televisão. Concluímos que os diários impressos têm opções para continuarem interessantes ao público. No entanto, a partir da constatação de que o caminho básico para isso já era conhecido há mais de três décadas, levantamos duas hipóteses. Uma é a de que jornalismo passa por fases em que as novas reaproveitam idéias das antigas que estavam abandonadas, assim como na moda de roupas. Outra é que os jornalistas sempre tiveram projetos sobre como deveria ser um bom jornal, mas nunca conseguiram executá-los plenamente e idealmente. Essa segunda hipótese é reforçada pelas dificuldades encontradas pelo Correio e pelo Globo em executar seus projetos. Entre essas dificuldades, destacam-se duas: a cultura profissional do jornalista, de temer ser cobrado por "furos" de concorrentes e priorizar saber de tudo um pouco em vez de se aprofundar em um assunto; e a das empresas em manter um quadro de jornalistas de qualidade e em quantidade suficiente para evitar que estes profissionais percam produtividade devido a uma carga de trabalho excessiva.