A ciclagem de nutrientes em áreas de cerrado e a influência de queimadas controladas

Abstract

Os efeitos de queimadas controladas sobre os fluxos e estoques de nutrientes, foram avaliados em áreas de cerrado denso da Reserva Ecológica do IBGE, Brasília-DF; comparando-se dois tratamentos: exclusão completa de fogo por 26 anos e queimadas quadrienais desde 1992. As duas áreas experimentais localizam-se sobre Latossolo Vermelho-Escuro, textura argilosa. A serapilheira sobre o solo foi amostrada nas duas áreas; na área de queima quadrienal, também foram coletados o material combustível (folhas, ramos e galhos menores que 6 mm de diâmetro) e as cinzas depositadas logo após a queimada. Os estoques de nutrientes no solo foram calculados a partir de amostras superficiais de solo (0-10 cm) para ambos os tratamentos, e também de amostras profundas, até 5 m, na área sem queima. Os fluxos de nutrientes foram avaliados, em ambas as áreas, pela utilização de coletores de chuva (“bulk precipitation”), coletores de lixiviados de dossel (“throughfall”), coletores de lixiviados da serapilheira (“litter leachate”) e coletores de solução do solo a 25 cm, 100(cm e 400 cm de profundidade. Alíquotas de 250 ml das soluções foram usadas para a caracterização química. Amostras de raízes até a profundidade de 800 cm foram coletadas para quantificação dos estoques de nutrientes. A taxa de decomposição da serapilheira foi medida através de um experimento com bolsas de decomposição com duração de 385 dias. Os estoques de N e P na biomassa foram de 218 e 12,9 kg.ha’1, respectivamente, enquanto que no solo foram de 4.576 e 2.Ò42 kg.ha’1,.demonstrando a maior importância do estoque no solo para N e P. Os estoques de K, Ca e Mg na biomassa (serapilheira + raízes grossas) foram de 62,4; 108 e 30 kg-ha1, respectivamente, enquanto no solo os estoques foram de 81; 77 e 25 kg.ha’1, demonstrando a importância do estoque na biomassa para estes nutrientes. As taxas de decomposição da serapilheira foram baixas, com meia-vida da serapilheira de 2,6 anos e tempo de residência de 10 anos. As taxas de meia vida dos nutrientes foram diferenciadas: K, Mg, Ca, P, N e S foram de 0,5; 1,3; 1,9; 3,1; 4,0 e 6,1 anos, respectivamente. Os nutrientes com maior mobilidade K, Mg e Ca são reciclados a partir da serapilheira com maior eficiência, e parecem não limitar o processo de decomposição. A concentração de P, N e S aumenta ao longo do processo de decomposição; a sua redução é mais lenta do que a perda de biomassa, e estes elementos parecem limitar o processo de decomposição. A deposição atmosférica de N, P, K, Ca Mg e S foi de 4,2; 0,01; 1,5; 3,6; 0,5; 0,7 kg-ha ’-ano1, respectivamente. O fluxo total de N, P, K, Ca, Mg, e S que alcança o solo foi de 9,3; 0,03; 28,3; 7,8; 6,4 e 0,6 kg-ha ^ano’1, respectivamente A reciclagem de Ca, K e Mg em relação ao estoque encontrado no ecossistema é relativamente maior, que a reciclagem de N e P. A disponibilidade de P avaliada através da extração seqüencial indicou um sistema com grandes estoques de P total, mas que, na sua maior parte encontra-se em formas oclusas no solo. O estoque de P orgânico total até a profundidade de 1 m foi de 259 kg.ha’1 e o P total foi de 2042 kgha'1. As concentrações de P disponível diminuíram com a profundidade, de 12,8 (0-10 cm) para 2,2 pg P.g’1 solo (400-500 cm). Houve também um aumento relativo da fiação oclusa (fiação residual + fiação HC1) com o aumento da profundidade. As concentrações de P microbiano variaram de 11,1 pg P.g’1 até 5,9 pg P.g1 para as profundidades 0-10 cm e 20- 50 cm, respectivamente. As concentrações de P microbiano sofrem interferência da sazonalidade, com reduções durante o período seco. As queimadas aumentam as concentrações de P inorgânico nas frações extraídas por NaHCO3 e NaOH, e reduzem a concentração de P orgânico. A fração orgânica sofreu uma redução significativa de 86 pg P.g1 solo para 78 pg P.g’1 solo. A ciclagem de nutrientes no Cerrado é alterada pelo fogo, que reduz os estoques de biomassa e nutrientes, provoca perdas de nutrientes por volatilização e lixiviação, empobrecendo o sistema. A reposição de K, Ca e Mg via deposição atmosférica ocorre em ciclos que podem variar de 4 até 15 anos, dependendo do volume de biomassa queimado e do nutriente considerado. O tempo de reposição do P pode chegar a 213 anos, devido às baixas taxas de deposição atmosférica. As reduções nos estoques e as alterações nas taxas de mineralização podem tomar áreas queimadas muito limitadas em N. O aumento das frações inorgânicas de P pode beneficiar o crescimento das plantas em áreas queimadas, mas ainda é necessário estabelecer os padrões de imobilização de P pela biomassa microbiana, e pelos óxidos de Fe e Al, para estabelecer até que grau este aumento das frações disponíveis de P se traduz em maior disponibilidade para o crescimento vegetal.