Transtorno do Especto do Autismo : funções executivas e cuidado parental

Abstract

Esta pesquisa teve como objetivo analisar o processo de desenvolvimento das funções executivas (FE) de crianças com transtorno do espectro do autismo (TEA) na perspectiva da pragmática do objeto, que amplia o desenvolvimento infantil para além da apropriação da linguagem e compreende o objeto como mediador semiótico na interação triádica, cujos usos e gestos privados permitem observar a construção do pensamento da criança pré-verbal. Crianças neurotípicas são inseridas em dinâmicas sociais orientadas para um determinado objetivo desde o nascimento. A verbalização apresentada no final do primeiro ano de vida evidencia a emergência do pensamento orientado para a resolução de um problema. Já o percurso do pensamento de crianças diagnosticadas com TEA emerge em meio a sistemas semióticos singulares, considerando as alterações na comunicação, oralidade e interação com pessoas e objetos relacionadas ao diagnóstico. Para melhor compreender esse processo, foi realizada a análise microgenética da interação triádica entre duas crianças dianosticadas com TEA e suas respectivas mães. Foram videogravados três momentos do desenvolvimento de cada criança, com intervalos de dois meses entre eles. Na sessão videogravada inicial a primeira participante tinha 2 anos e 3 meses, e o segundo, 1 ano e 10 meses. Trata-se de pesquisa empírica qualitativa de corte longitudinal. As videogravações foram analisadas e categorizadas com o apoio do software ELAN 5.8, e alguns trechos foram transformados em gráficos com o apoio do programa R. Realizadas na casa das famílias durante a pandemia da covid-19, as videogravações e captações de áudio foram feitas pelos próprios moradores. As categorias de análise e o referencial teórico se basearam em estudos anteriores, mas com o acréscimo de subcategorias complementares. Gestos e usos dos objetos (dois por sessão) foram analisados desde o planejamento da ação até a avaliação do objetivo alcançado pelas crianças e pelas cuidadoras implicadas na relação triádica, sendo considerados elementos verbais e não verbais enquanto mediadores semióticos relacionados à tarefa. Os resultados indicaram que crianças diagnosticadas com TEA apresentam usos protocanônicos, canônicos e rítmico-sonoros a partir dos 14 meses e que a mediação do adulto está diretamente relacionada à emergência de constructos referentes às FE no curso da ação desempenhada pela criança. As cuidadoras agiram de maneira intencional e comunicaram o objetivo da tarefa de diversas formas, contribuindo para o engajamento da criança diagnosticada. Os gestos ostensivos exploratórios e privados apresentados pelas crianças e pelas cuidadoras foram importantes preditores para o uso canônico dos objetos. As ações direcionadas ao planejamento da ação, bem como os gestos e usos dos objetos, têm função autorreguladora e correguladora nas interações triádicas analisadas.