Fora do Plano, em luta pelo espaço : memória, distopia e arquivo em narrativas das periferias

Abstract

Considerando que hierarquias sociais, raciais, políticas e simbólicas são determinantes para a configuração do espaço, esta tese analisa como produções artísticas das periferias estetizam as experiências de habitar as margens das cidades, contribuindo para a desconstrução de um imaginário social repleto de preconceitos e para o enfrentamento de práticas excludentes que deles decorrem. Para tanto, considera a hipótese de que a representação do espaço, elaborada por olhares das periferias, pode reconstruí-la como território do qual personagens se apropriam a fim de ressignificar o sentido da degradação e da precariedade, sem perder de vista a consciência crítica da necessidade de superação de problemas sociais. Com isso, discute também, a partir das alterações que essas obras geram no campo literário, com a entrada de artistas das periferias e a construção de uma linguagem específica, ferramentas teóricas e estratégias de leitura para abordagem dessas produções. Como corpus desta pesquisa, foram selecionadas narrativas contemporâneas que, produzidas pelo ponto de vista da população negra e periférica, configuram marcos de resistência à ordem social vigente ao abordarem os arbitrários e complexos processos de violência e apropriação identitária que instauram formas de exclusão do espaço: os filmes A cidade é uma só? (2011) e Branco sai, preto fica (2015), do diretor ceilandense Adirley Queirós; o romance Becos da memória (2006), da escritora mineira Conceição Evaristo; e o texto teatral Namíbia, não! (2010), do baiano Aldri Anunciação. Em função das especificidades desse corpus, uma base teórica multidisciplinar, composta por contribuições de estudiosas e estudiosos de diversos campos de conhecimento, como teoria literária, ciência política, geografia, história e educação, fundamenta esta investigação, que se justifica pelo fato de que as periferias, historicamente vitimadas pelas violências do Estado, têm formulado novos olhares com a publicação de realizações estéticas de diferentes linguagens e de relevante significado político e social na medida em que reconfiguram identidades, elaboram formas de expressão artística mais democráticas e colaboram para superar a representação estereotipada e desumanizadora na qual essas áreas e seus habitantes foram limitados.