"Ela chegou lá" : discurso meritocrático e táticas juvenis de apropriação do capital midiático nos estudos

Abstract

A investigação trabalha a ampliação do capital cultural inserida na cultura digital e nas vivências escolares de jovens periféricas. Para isso, analisamos criticamente quais as condições de produção do discurso em uma leitura e releitura da mídia por jovens de escolas públicas do Distrito Federal, levando em consideração a apropriação do capital midiático. Tivemos como base teórica Bourdieu (2013), Setton (2005), Freire (1971), Martín-Barbero (2009), Hall (1980), Gramsci (2017), Certeau (1998) e Chartier (1998). Realizamos o acompanhamento de 13 jovens de distintas realidades do Distrito Federal e do Entorno por dois anos, de 2020 a 2022, com entrevistas semiestruturadas e assistências a reportagens. O acompanhamento ocorreu desde o último ano do Ensino Médio até os primeiros semestres na universidade. Fizemos a codificação e a decodificação de 10 matérias televisivas da mídia hegemônica a partir do modelo de Hall (1980). Os responsáveis, em especial a mãe, são aqueles que provêm uma determinada moratória da juventude durante o ensino médio, a fim de que as jovens possam de dedicar integralmente aos estudos, apesar das limitações financeiras. Os valores familiares salientam o trabalho duro, a importância da força de vontade e da perseverança. Quando falam que as mães são guerreiras e batalhadoras, elas têm para si como devem se portar no mundo do trabalho. Por terem o professor como referência, as jovens frisam a importância de um profissional ativo e entendedor de sua responsabilidade social. Por isso, quando utilizam a mídia para se apropriarem de conteúdos acadêmicos, as jovens têm o professor como alicerce de confiança e direcionamento. Elas sentem necessidade de consumir bens midiáticos que as auxiliem a estudar para a universidade e se ambientar nos códigos necessários. Entendedoras da desigualdade social em que estão inseridas, algumas se apropriam de capital midiático como tática e o utilizam na luta simbólica. O método escolhido revela que a ideologia rege as práticas sociais das jovens ao analisarmos a colonização das subjetividades e constatarmos que diversos pensamentos das jovens, como a negação das cotas, em especial as raciais, e das próprias desigualdades sociais, alinham-se a leituras dominantes, logo hegemônicas. A importância da vivência universitária, o caráter da instituição de ensino – público ou privado – e a escolha dos cursos auxiliam a conformar leituras da mídia. As jovens que ingressaram via cotas em instituições federais tiveram mais leituras resistentes ou negociadas que dominantes. Como contribuição científica, frisamos a análise de um acompanhamento de dois anos, o que salienta as modificações tanto na leitura da mídia meritocrática como na relação com a apropriação do capital midiático, um capital cultural relacionado à cultura digital e que é utilizado como tática, ao evidenciar as subjetividades dos sujeitos.