Percepção de risco, conhecimento e práticas de segurança dos alimentos : o contexto de crianças e adolescentes brasileiros

Abstract

Garantir um ambiente propício à Segurança dos Alimentos permeia todos os elos da cadeia de abastecimento alimentar e uma abordagem dirigida aos jovens pode potencialmente mitigar as Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar. Porém, antes que as ações de intervenção sejam realizadas, o público-alvo deve ser diagnosticado. Os objetivos deste trabalho foram realizar a validação de construto do instrumento desenvolvido por Batista et al. (2021), testar a hipótese de que ambos os métodos de sua aplicação (presencial e online) são válidos; e compreender e avaliar os fatores relacionados à Segurança dos Alimentos na perspectiva de crianças e adolescentes de escolas públicas das Regiões Administrativas do Distrito Federal e do município de Sorocaba - SP. Participaram do estudo crianças e adolescentes de nove a 17 anos. Primeiramente, foi utilizado um protocolo rigoroso para combinar os modelos online e presencial para validação de construto, que resultou em cinco formas de aplicação do instrumento de avaliação de aspectos relacionados à Segurança dos Alimentos. Os resultados foram avaliados quanto a confiabilidade (reprodutibilidade e consistência interna) e validade (validade discriminante). Para a determinação dos coeficientes acima foram utilizados: o Coeficiente de Correlação Intraclasse, o Alfa Cronbach e o teste t de Student para amostras independentes, respectivamente. Posteriormente, aplicou-se o instrumento validado para compreender e avaliar fatores relacionados à Segurança dos Alimentos do público-alvo. Foram realizados testes de diferenças e correlações para alcançar os objetivos propostos. No estudo realizado no Distrito Federal, também foi aplicada a lista de verificação de Boas Práticas para Unidades de Alimentação e Nutrição Escolar para aprofundar na compreensão da percepção de risco dos estudantes desta localidade, por meio da comparação entre o risco atribuído pelo estudante e o diagnóstico de risco sanitário. Na etapa de validação de construto, a amostra foi composta por 439 estudantes de 10 a 14 anos de escolas públicas e privadas do Distrito Federal. Nas etapas seguintes, participaram do estudo 1.420 estudantes de 9 a 17 anos, matriculados em 25 escolas públicas do Distrito Federal; e 1.477 estudantes de 10 a 16 anos de sete escolas públicas de Sorocaba. O estudo obteve aprovação ética em todas as etapas e a participação dos estudantes foi condicionada à apresentação dos Termos de Consentimento e Assentimento Livre e Esclarecido. Os resultados relativos à validação de construto (confiabilidade e validade) indicaram que o questionário de conhecimento apresentou coeficientes de estabilidade e validade discriminante adequados, e o questionário de práticas autorreferidas obteve coeficientes de estabilidade e consistência interna aceitáveis. De maneira geral, identificou-se que uma proporção mais significativa de estudantes atribuiu baixo risco de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar aos alimentos produzidos e distribuídos nas escolas. Também foram identificados baixa percepção de letalidade, viés otimista, conhecimento mediano, práticas de risco e lacuna entre conhecimento e práticas seguras de manipulação/consumo de alimentos. Ademais, no Distrito Federal foram identificadas correlações entre vulnerabilidade social e percepção de risco (positiva) e práticas autorreferidas (negativa). Em Sorocaba, correlação positiva entre o percentual de pessoas pretas/pardas e percepção de risco e correlação negativa com a renda per capita e viés otimista. Os resultados apontam para a urgência de considerar crianças e adolescentes para garantir a Segurança dos Alimentos, considerando que já atuam no preparo de alimentos no ambiente doméstico e que serão os futuros manipuladores em qualquer etapa da cadeia de abastecimento alimentar. Ademais, estão em uma fase cognitiva propícia para a formação de hábitos de higiene dos alimentos. As ações a serem desenvolvidas devem considerar a maior vulnerabilidade social que esta população está exposta, as questões estruturais inerentes e como esses indivíduos podem agir frente a sua realidade e com ferramentas acessíveis. A não consideração dos aspectos sociais, econômicos e culturais da população na formulação de ações e políticas, pode levar ao seu fracasso.